domingo, 16 de janeiro de 2011

São Silvestre, 1999

Por Antonio Prata
Publicado na revista Runner's http://runnersworld.abril.com.br/

Aos vinte e dois anos eu corri pela primeira vez sem ser para pegar um ônibus, fugir de ladrão ou por coação de um professor de educação física. Era janeiro de 1999, eu tinha parado de fumar e, com medo de dobrar-me aos insistentes apelos da nicotina, resolvi dar a meu corpo um tratamento de choque: me inscrevi para a São Silvestre.

Não foi uma decisão pequena. Até então, eu e o esporte não havíamos tido uma relação muito amigável. No futebol, sou tão ruim que até hoje não descobri se chuto com a direita ou com a esquerda. (Desconfio que, na verdade, com nenhuma das duas.) No vôlei, quando a bola vinha na minha direção, eu começava a entrelaçar os dedos, preparando uma manchete e geralmente só terminava a complexa operação quando o outro time já estava comemorando o ponto. Acho que nunca fiz uma cesta no basquete nem um gol no handball e, jogando tênis, juro, consegui quebrar o dente da frente, acertando-me uma raquetada. Até que, aos vinte e dois anos...

No final de janeiro, matriculei-me numa academia e expus ao instrutor meus objetivos. Ele passou-me treinos de corrida e musculação e comecei minha empreitada. O início foi terrível. Depois de dez minutos correndo, parecia que eu ia vomitar. E depois, morrer. Levou algumas semanas para que eu conseguisse correr meia hora, direto. (E pouco mais de um mês para que eu corresse meia hora, direto, sem achar que ia vomitar. E depois, morrer.) Nesse mesmo período, pela primeira vez na vida, encostei os dedos no chão, sem dobrar os joelhos. Senti o que devem sentir os atletas olímpicos, ao subir ao pódium. Em seis meses estava correndo dez quilômetros e, em novembro, na Praia da Fazenda, Ubatuba, corri os quinze, finalmente.

No dia 31 de dezembro, gabaritei as recomendações nas matérias dos jornais: tomei bastante líquido, comi macarrão com molho de tomate e, às cinco da tarde, em meio a um monte de Elvis, Rauls Seixas e grupos com faixas como “Associação de Ex-Bancários de Jacareí” e “Equipe Ponto Frio Sacomã”, saí da frente do MASP para correr minha primeira prova.

Eu não tinha ideia de que a São Silvestre fosse aquela festa. Não houve um metro dos quinze mil do percurso em que não houvesse gente nas calçadas, incentivando. Pais com os filhos nos ombros, balançando bandeirolas do Brasil, aposentados nas janelas, no Minhocão, acenando, famílias inteiras, na Brigadeiro, aplaudindo, garotas de programa, na Consolação, dizendo “ai, coração, vem suar aqui comigo!”. Bem, essas últimas não estavam exatamente incentivando-nos a continuar a prova, mas considerando-se o visual de algumas das profissionais, não deixava de ser um estímulo para sairmos correndo.

Fiz a prova devagar, terminei-a em uma hora e trinta e nove minutos e cheguei em oito mil e não sei quanto, atrás de muitos Elvis e Rauls, mas não me importei com tempo ou colocação, não era para isso que corria.

Há quem diga que, passados dez anos, já esteja na hora de tentar correr com uma bola nos pés ou nas mãos, mas acho melhor não. Em time que está ganhando, não se mexe – e essa é a maior vantagem do nosso esporte sobre todos os outros, podemos sair vitoriosos mesmo chegando atrás de um Raul com cabeleira no ombro e violão nas costas e de mais de um Elvis, de roupa de couro branca, na fase gordo.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Dica de Livro

Nascido Para Correr : A Experiencia De Descobrir Uma Nova Vida

Este livro conta a história de um esportista que, ao sentir constantes dores nos pés, consulta um especialista que diz que o corpo humano não foi projetado para exageros. A partir dessa sentença, o autor começa a procurar respostas para suas perguntas, que além de laboratórios, incluiam a visita a tribo de índios Tarahumaras, os maiores corredores do mundo.

Autor: MCDOUGALL, CHRISTOPHER
Tradutor: ZIEGELMAIER, ROSEMARIE
Editora: GLOBO