quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Depoimento - Maratona de Nova Iorque



Eu costumo levar muito a sério minhas resoluções de ano novo. Acontece que, este ano, meus planos para 2010 incluíam uma maratona e o desejo de ter a companhia de Ivan para fazê-la. Assim, anunciei minha intenção e fiz o convite a ele. Ele fez aquela cara pouco receptiva e argumentou que “não faço planos de correr uma maratona agora, não posso me ausentar do comando do Hospital, voltamos há pouco de Nova Iorque...”. Como se ele não me conhecesse e não soubesse que quando eu coloco uma coisa na cabeça, dificilmente retrocedo e menos ainda desisto da idéia. Ameacei ir sozinha e ele decidiu por ir também, depois que teve certeza que eu falava muito sério.
Como eu tenho uma história de amor roxo com Nova Iorque, o lugar de partida para o grande desafio e sonho de qualquer corredor, já estava definido, já que a Big Apple reúne enorme número de corredores, grande torcida nas ruas e uma organização impecável, sem falar que o lugar na minha opinião é o centro do universo, a capital do planeta.

Dediquei-me a estudar o percurso, ler tudo que achei sobre o assunto, principalmente do site oficial da maratona, e a conversar com outros corredores sobre planilhas e a sugestão de um técnico. Como corremos desde 2001, e fazíamos uma trilha de barro em Pium, aos sábados, com outros corredores, o Rodrigo recomendou-nos o Batista da Equipe Desafio; disse que ele tinha formação em Ed. Física, que era ex-militar e que poderíamos, inclusive encontrá-los em outro sábado, já que ele treinava naquela mesma trilha.

Ainda em Janeiro, conhecemos o Batista, que além de excelente técnico, é um atleta/corredor de ponta, tendo ganhado a Volta da Pampulha na categoria dele no ano passado. Quando eu o vi pela 1ª vez, eu corria na direção contrária dele e nesta oportunidade ele já deu uma avaliada rápida e disse que tenho biotipo de corredora. Ele perguntou se queríamos começar de imediato, mas decidimos aproveitar o resto do veraneio na companhia de nossos filhos e começar apenas dia primeiro de fevereiro, achando que 9 meses seriam suficientes para estarmos prontos.

Na data combinada, fomos à Pista de Atletismo do Campus Universitário e iniciamos nosso treinamento com um teste de 2400 metros. Fizemos também check-up completo e o teste Ergoespirométrico com Dr. Felipe Guerra e, com isso, o Batista teve elementos para fazer uma planilha personalizada, de acordo com a nossa realidade. Além disso, fui à Dra. Fátima Nunes, nutricionista esportiva e comprei um relógio com GPS para registrar meus treinos e ritmar melhor minha corrida.

Até este ponto, já havia feito muitas corridas de rua de 5 e 10 kms, uma meia-maratona com o “vergonhoso” tempo de 2 horas e 33 minutos e um longão de 25 kms, despreocupada com o tempo final. Aliás, velocidade nunca foi o meu forte, sempre preferi distância à velocidade, talvez porque, até o momento, corrida era hobby, lazer, esporte pelo qual eu e Ivan dividimos a mesma paixão, mas que pelo fato de não sermos muito competitivos, não dávamos importância à técnica, postura corporal, alimentação adequada, suplementos alimentares, hidratação, descanso, treino de tiros....mas uma maratona iria exigir da gente muito mais.

Ficou bem claro para nós, logo no início dos treinos, que maratona não admite improvisos, falta de dedicação e menos ainda, dúvidas da própria capacidade. Por isso, nosso treino foi dividido da seguinte forma:

· 3as e 5as – trote, alongamento, exercícios de coordenação motora e postura e tiros
· 2as, 4as e 6as – corrida de cerca de 1 hora na rua e musculação em pelo menos 2 destes 3 dias.
· Sábado – longões na Rota do Sol ou na trilha de barro de Pium
· Domingo – descanso, com a opção de fazermos hidroginática

Descobrimos que pouca coisa ou quase nada sabíamos de corrida, a começar pela postura inadequada que prejudicava a biomecânica da corrida. Mas, atentos, procurávamos ouvir os mais experientes e, principalmente, o Batista, mesmo sem entender ou concordar com sua orientações algumas vezes. Pareceu-nos esquisito, na época, fazer um longão de 21 kms e depois voltar a fazer um de 16. Por que? “Escute o Batista”, repetia o Béco, confiante na experiência dele. Aos poucos, percebíamos o quanto ele tinha razão.

Paralelamente aos treinos, cuidava dos preparativos da nossa viagem. Como a maratona de NY é concorridíssima, eles lançaram uma loteria: você paga US$ 11,00 para concorrer à vaga. Caso não seja sorteado, mais duas opções: trabalhar junto a uma instituição beneficente arrecadando dinheiro ou comprar sua inscrição junto a uma das duas agências oficiais no Brasil: KAMEL ou CHAMONIX. Como nós e mais 210 mil pessoas não foram sorteados, comecei a contactar as duas e optamos pela KAMEL. A viagem tornou-se bem mais cara, mas valeu cada centavo investido. Quando definimos a data que ficaríamos em NY, decidimos que queríamos chegar com uma semana de antecedência para nos adaptarmos ao frio intenso e curtimos o Halloween. Uma coisa que muito lamentamos foi que dois dias depois da maratona seria o aniversário de nossa filha e ela não poderia ir conosco, já que estaria em plena semana de prova. Para nós, foi muito importante a paciência e compreensão de nossos filhos quando das nossas ausências. Deixar de compartilhar da presença deles foi o maior dos sacrifícios.

Com cansaço constante, tivemos de fazer algumas alterações em nosso dia-a-dia: aquela batata frita eventual, nunca mais; passamos a dormir pontualmente às 21:30 e reduzimos nossa vida social a quase zero. Exagero? Isso ajudou e muito porque os treinos foram, gradativamente, exigindo cada vez mais da gente. Na nossa casa não podia faltar gelo para aplicar nos machucados, fiz algumas seções de fisioterapia também. E estava determinada e segura que precisava “torturar” mente e corpo em treinos extenuantes para que as dificuldades na hora da maratona fossem diminuídas.

Eu poderia listar aqui milhões de motivos, entre eles: Por que não correr uma maratona? Eu queria saber o tamanho de minha determinação e coragem para atingir meu objetivo, saber se eram maiores e mais fortes do que os temidos "muros" e "ursos" do km 30, dar o exemplo de persistência aos meus filhos, ir mais longe, saber a sensação de correr com 45 mil pessoas, de cruzar a linha de chegada, pendurar a medalha no pescoço e ter certeza que fiz tudo para merecê-la.

Foi de enorme ajuda fazermos parte de uma equipe de assessoria esportiva, ainda mais de uma como a Desafio, cujos integrantes torcem e muito pelos progressos um do outro. O Camilo sempre se oferece para dar o último tiro me acompanhando porque sabe do meu cansaço e quer estimular-me: "Perna e braço, Vanvan!" Lembro de quando fiz 10 kms em menos de uma hora pela primeira vez, o Batista disse-me para eu ir com tudo, despreocupada de quebrar e não deu outra: 58 minutos e 27 segundos. Mas, cuidadoso como ele é, esta recomendação levou muitos meses para ser dada, somente quando ele confiou que eu, sem me machucar, manteria o ritmo e conseguiria.

Na meia-maratona de Natal, fiz 2 horas e 11 minutos, num percurso difícil, cheio de ladeiras, sem quase torcida nas ruas e num dia muito quente, condições que cobram muito de um corredor.

Ivan, na metade de nosso treinamento, lesionou-se; foi um enorme susto porque tememos que ele ficasse impossibilitado de continuar treinando e isso alterasse nossos planos. Com a redução da intensidade dos treinos, fisioterapia e muito gelo, ele melhorou e retomou rapidamente à pista de atletismo. Diagnóstico? Falta de musculação, prática a qual eu me dedicava com afinco.

Lendo muito e conversando com gente que já fez a prova, conclui que o percurso com altimetria duríssima é inadequado para estreantes em maratona, muita ousadia para quem nunca tinha corrido mais do que 32 kms, longão que fizemos de Barra de Tabatinga ao pé da Ladeira do Sol, com o apoio de Batista, abastecendo-nos com gel, água de côco, água e gatorade. Mas, nada fácil tem graça.

O tempo passava, os treinos aumentavam, as unhas roxas caíam, bolhas e calos se multiplicavam e nós cada vez mais determinados e confiantes, mas sem subestimar a grandeza e as dificuldades de uma maratona. Um dia, depois de fazer apenas 18 km, mas durante persistente chuvinha fina, cheguei em casa, tomei meu banho, alimentei-me e chorei, tal qual uma criança. Ivan ficou preocupado, sem entender o que eu sentia. Fisicamente, uns dedinhos e unhas meio amassados do atrito da meia e tênis molhados, mas emocionalmente, grande mal estar e esgotamento mental por insistir a treinar com tamanho incômodo. Precisava chorar e olha que sou das mais duronas. Outra coisa que sentia com frequência após longões era muito frio por causa de enorme perda calórica em curto espaço de tempo, sendo do clube das magrinhas, isso quase sempre se repetia.

Batista, você acha que tenho condições de terminar uma maratona? Isso foi perguntado várias vezes e, no início ele, cautelosamente, só repetia “vamos ver!”. Um dia ele disse que tinha certeza que eu terminaria e eu lembro de que pensei que o meu desejo era enorme, que isso faria até mesmo eu me arrastar, se precisasse, até a linha de chegada.

"Bruninho, o que você acha de ter um pai e mãe maratonistas?" Meu filho, sabiamente e com a ironia peculiar de um adolescente respondeu: “Psiu, você ainda não correu!”. E ele tinha razão, imprevistos acontecem e durante uma maratona, muita coisa pode surgir para nos retardar ou ameaçar a conclusão da prova. Aliás, o grande barato de correr uma maratona pela 1ª vez é não saber se você consegue, a excitação da dúvida, saber que precisa empenhar-se muito para compensar a inexperiência.

Segundo recomendações da Agência Kamel, chegamos ao aeroporto de Natal para embarcar uma hora antes, levando nossa roupa da Maratona na bagagem de mão, para evitar extravio e os tênis da maratona em nossos pés. Assim que entreguei o “voucher”, a moça da GOL avisou-me que nosso vôo sairia em 3 minutos, que o horário de embarque era o de Brasília, que tem horário de verão. Eu falei que o horário estava diferente por causa de erro deles, exigi que eles segurassem o avião e corri para chamar o Ivan, que estava estacionando o carro. Começamos a correr bem antes do que imaginávamos no lotado aeroporto de Natal, acompanhados pela moça da Companhia, com meu nada discreto cabelo vermelho-hemorragia que fiz em homenagem à maratona. Fomos os últimos a embarcar, se tivéssemos perdido aquele vôo, perderíamos também a conexão em S. Paulo para NY e a Parada de Halloween, que eu tanto queria ver. Começar logo assim uma viagem tão sonhada e programada com tanta antecedência com requintes que beiram o transtorno obsessivo compulsivo?

Uma semana antes da maratona, eu e o Ivan praticamente não falamos de outro assunto, ainda mais com a cidade cheia de cartazes de boas-vindas e com lojas e restaurantes com promoções para os pretensos maratonistas. Em toda esquina, deparávamos com corredores do mundo inteiro treinando, ainda mais no Central Park, onde também fizemos 3 treinos.

A organização e estrutura da corrida são impecáveis, irretocáveis. Eles param a cidade em função da maratona, isolam o trânsito, motivam muito os corredores e à população para ir para as ruas torcer, têm um site com informações super detalhadas, comunicam-se sempre com a gente através de e-mails para estarmos a par de tudo. A EXPO é perfeita, dura 3 dias e tem stands enormes de todas as marcas esportivas, lançamento de livros sobre corrida com palestras dos autores, e patrocinadores distribuindo brindes que fica difícil da gente carregar se for pegar tudo. A loja Paragon oferece ônibus gratuito da Expo para a loja, onde somos brindados com um almoço bem americano: pizza, cachorro quente, bagel, maçã e banana.

Na véspera, a estrutura da corrida oferece 2 programas imperdíveis: Corrida da Amizade (5 kms) e o Jantar de Massas, que é servido no Central Park, em barracas montadas ao redor do Restaurante Tavern on the Green. São duas oportunidades de confraternizar com corredores do mundo inteiro. Os tradicionais fogos de artifício encerram a noite cedo, para que todos descansem o suficiente.

É tanta coisa que nos recomendam para ajudar, que a gente fica em dúvida, diante de tantas alternativas. Hora de definições, já que nada deve ser experimentado no dia “M”: Com que roupa eu vou? Que gel tomar?...mil questionamentos para os "marinheiros de 1ª viagem". Como o site oficial da Maratona define até a marca da água, repositores e gel que seriam distribuídos, o Josivan, experiente maratonista, cedeu-nos o tal do Power Bar, em um dos últimos longões. Muita náusea e mal estar gástrico e intestinal durante o treino. Optamos, então, pelo nacionalíssimo Carb Up, de 6 em 6 kms, com o qual já estávamos acostumados. Como correr durante tanto tempo estimula em demasia o intestino, alguns tomam Imosec para inibir o estímulo, mas evitei porque nunca tinha experimentado. Levei as cápsulas de sal, mas não vi necessidade de usar. A quantidade de roupa estava adequada, o frio extremo passou depois de uns 2 kms, mas resolvi manter luvas, protetor de orelhas e manguitos porque as extremidades sempre são mais vulneráveis. As meias de compressão ajudaram muito, protegeu do frio e diminuiu a fadiga. O boné da Equipe Desafio não podia faltar e a pequena bolsa na cintura guardava os géis e a máquina fotográfica. Antes de largar, usei dois cobertores que podia aproveitar tanto para sentar, deitar em cima como para aquecer-me, já que deixamos o hotel 6 da manhã e só larguei 10:20. Ainda bem que deu para alongar, tomar café, ir ao banheiro 3 vezes, bater papo com outros corredores, tirar fotos, deixar casaco no guarda-volumes e acompanhar tudo com calma.

ARE YOU READY TO RUN? A largada é emocionante: hino nacional, tiro de canhão e Frank Sinatra cantando New York - New York. Gravei tudo. Com a excitação, todo mundo esquece de ver a linda paisagem da Baía de NY e do oceano do outro lado, na Ponte Verazzanno, a 1ª das 5 que teríamos no percurso, locais onde o vento nos joga para todos os lados.

Corremos com a elite, os melhores na categoria e com amputados, cadeirantes, deficientes visuais, idosos, gente com outras restrições, mas que na minha opinião, são os verdadeiros campeões e heróis da maratona. Em muitas camisetas lemos mensagens que nos dão idéia das motivações de cada um para estar ali, como por exemplo: "Por papai, continue lutando". Tinha também os bem-humorados, com fantasias muitas vezes até bem pesadas. Um deles levava escrito nas costas: "Meu nome é Ed, diga-me porque você está correndo uma maratona". Muitos grupos de corredores paravam para tirar fotos em lugares bonitos. Como dizia a mensagem do avião: "Respire fundo e aproveite o momento". Também havia muita gente correndo para angariar fundos para caridade. E conseguiram 1 milhão por milha: 26,2 milhões para instituições. Só voluntários, ninguém é remunerado para isso. Gestos dos quais o nosso planeta está muito carente.

A todo tempo a população nos oferecia gel, vaselina, lençinhos, balinhas, frutas... Eu apanhei uma banana e dividi-a com um corredor que estava ao meu lado; este espírito solidário impera entre corredores, mesmo que não falem a mesma língua. O carinho da torcida era enorme e ajudou-me muito. Crianças e adultos enfileirados, batiam em nossas mãos. Alguns cartazes: "Vocês estão correndo e nós estamos congelando para torcer por gente que nunca vimos", "Suas pernas estão doendo porque você está chutando traseiros (expressão americana que quer dizer que você é muito bom em algo)", "Corredores são sexy", "Abraços grátis", "Você pode", "Não desista", "A dor é provisória, desistir é definitivo", "Não pense em cervejas e sofá agora". Fiz questão de correr com a camiseta oficial da seleção brasileira de futebol e a todo momento, ouvia de gente de todos os países: "Vai, Brasil!". Isso "sacudia-me" inteira, dava uma emoção forte.

Meu objetivo era divertir-me, curtir a grande festa, mas sem perder o foco de terminar em média até 4 horas e meia, previsão que eu e Batista fazíamos, por isso, nada fotografei durante o percurso. Imagina ensaiar tudo durante 9 meses e na hora "H" improvisar, alterar o script ou deixar-me emocionar pela multidão a ponto de esquecer o "pace" (ritmo). E isso não é missão fácil porque a torcida é contagiante, tanto que meu ritmo era de 6min20segs/km e pelo menos uma vez, eu chequei o cronômetro e estava a 4:40; isso depois que sai da silenciosa Ponte Queensboro e cai na 1ª Avenida, repleta de gente e com torcida animadíssima, onde os berros misturavam-se ao som dos sinos e bandas em várias esquinas.

Como a organização da corrida distribuía água e gatorade a cada milha (1,6 km), devo ter hidratado além da conta e fiz grande parte da corrida com a bexiga cheia, evitando as filas enormes dos banheiros que ficavam também a cada milha. Outro incômodo foi o medo constante de cair. Imagine-se num "mar" de 45 mil corredores, que jogam líquidos, copos, recipiente de gel, cascas de banana e laranja e roupas pelo chão. A todo hora tínhamos que desviar de tudo e até mesmo quando diminuísse o ritmo ou mudasse a direção, isso tinha que ser feito de forma muito cuidadosa. Como a população européia e americana tem uma estatura bem mais alta que a minha (1m65cm), eles corriam com o cutuvelo raspando em meu rosto. Frio, muitas ladeiras, distância de 42 km e outros imprevistos a enfrentar. Mas guerra é guerra. Também era difícil desviar, ultrapassar alguém, devido ao grande número de pessoas. Particularidades da maior das Majors Marathons.

Apesar da forte canelite e fascite que tive durante o ano, na corrida, só senti uma discreta dor no pé esquerdo. A todo momento vi gente parando, alongando, demonstrando exaustão nas expressões, "quebrando". Todos eram encorajados pelos outros corredores. Apenas um deixou bem claro o que queria, demonstrando não querer palavras de incentivo: "Eu vim aqui para andar!".

A mente cansou-se antes das pernas. Minha capacidade cárdio- respiratória é muito boa, também fiz muita musculação e treinos adequados, bem orientados pelo Batista. O corpo aguentou bem o trampo, mas em determinado momento, tive que apelar para alguns artifícios para enfrentar emocionalmente melhor a "tortura" de passar tanto tempo correndo: repassei mentalmente as metas que eu tinha fixado para aquela corrida, relembrei meu empenho nos treinos, controlei a excitação e temores visualizando mentalmente eu concluindo e recebendo a medalha, e a todo momento mantive aquela "conversa interna" comigo, com estímulos bem positivos e encorajadores: "Eu estou preparada, confio em mim, vou conseguir, está tudo conforme planejado até agora". A lembrança do incentivo dos amigos, principalmente da Equipe Desafio e da confiança do Batista em mim, não me deixaram diminuir o ritmo. Aliás, na 1ª metade, eu tive que freiar muito para manter o ritmo que ele recomendou, com intenção de guardar energia para todo o percurso.

Dediquei esta maratona a uma pessoa muito especial para mim, colocando escrito nas minhas costas "For Bella" (por Bella); isso deu-me uma força e energia incrível, vontade de fazer bonito para que a homenagem fizesse jus à minha cunhada.

Ivan tinha largado na 1ª wave, num dos 1ºs currais, bem antes de mim e fiquei pensando no quanto ele esperaria eu concluir, estando no frio e cansadíssimo, sem falar na fome e sede insaciáveis que uma atividade extenuante como essas dá.

30º km: Não vi muro nenhum. 32º km: daquele ponto em diante, tudo seria novidade porque nunca corri mais que isso. Eu estava disposta a levar o "urso" para passear ou dar um sarrafo nele, mas ele não apareceu. Ás vezes, criamos mitos, e o nosso medo ajuda a concretizá-los. Sempre que me falavam do tal muro, que a perna travava neste ponto, eu, imediatamente pensava em buracos neste muro, em alternativas de desviá-lo. Nem um muro físico, nem emocional ía me segurar. Eu iria rastejar até a “finish line”, mas eu terminaria aquela maratona porque eu investi muito dinheiro e expectativa (priceless) neste sonho, abri mão de muitas coisas para realizá-lo. Falei para todo mundo que se eu andasse, não ía querer a medalha porque não a mereceria. Onde se viu andar numa maratona? Treinei para correr, se não conseguisse, teria outras oportunidades para tentar, mas teria que ser correndo, embora nada tenha contra quem acha que fez uma maratona decente andando em alguns trechos. Como aliado, tinha o clima frio, torcida, auto-confiança, certeza que tinha me preparado...só dependia de mim!

Nos últimos 8 kms, com a sensação nítida de que não iria "quebrar", abandonei um pouco o plano de corrida (6:20) e apertei um pouco mais o passo. Tinha uma garota com um cartaz de 4:30, e quem quisesse acabar neste tempo, teria que seguí-la; lembro que ora ela me ultrapassava, ora eu a ultrapassava. Que fôlego ela tinha!!! Gritou palavras de incentivo os 42 kms para o grupo que a acompanhava.

Sempre que passávamos por tapetes onde o chip era acionado, o pessoal fazia algazarra, levanta as mãos pq sabia que ali seriam fotografados e filmados. Que energia maravilhosa estar participando disto com tanta gente animada.

Como a corrida me empolga! Posso estar cansada, doente, aborrecida; é só calçar os tênis que me transformo. Correr deixa-me com o espírito leve, relaxada, mais viva do que nunca, com baterias recarregadas o dia inteiro, ainda mais porque nosso grupo de corrida é superdivertido e vibramos muito com o progresso um do outro. A corrida possibilita-me muitos ‘insights’, permitiu-me fazer amizades maravilhosas, mantém minha boa forma, previne doenças e por ser um esporte/lazer que pratico com meu esposo colabora para que a sintonia entre o casal só aumente. Enfim, a tal da corrida equilibra TUDO. Imagina fazer parte de uma maratona? A sensação é de ir a melhor festa do ano.

Ver as árvores do Central Park, fez-me chorar; na entrada do Parque, liguei novamente a filmadora, vibrei muito, cantei New York-New York (Gosto em especial da parte da música que diz "Se você fizer lá, você faz em qualquer lugar, depende de você"), agradeci a DEUS, agradeci quem me estimulou, e a mim mesma, por ter me dado um dos melhores presentes que ganhei.

Não consegui dormir depois de tanta excitação, fomos à boite, onde quase todos usavam a mesma medalha que a gente e dançamos muito. Durante o resto da semana, ouvimos depoimentos lindos, emocionados de muitos corredores e presenciamos a chegada de tantos pela tv. O mineiro que ficou preso numa mina chilena terminou em mais de 5 horas, uma senhora de 83 anos terminou em mais de 9 horas. Todos eles superaram seus limites pessoais, tiveram a coragem de ousar, de ir além.

Senti-me outra pessoa, depois daquelas 4 horas, 26 minutos e 52 segundos. Com certeza, quando cruzei a linha de chegada, não sentia-me mais como a mesma que tinha largado, muita coisa mudou. A sensação mais forte ao chegar era SE EU ME EMPENHAR, TUDO ESTÁ AO MEU ALCANCE. EU POSSO QUALQUER COISA. O Ivan fez em 3 horas, 45 minutos e 22 segundos. Excelentes tempos para dois estreantes e foi uma satisfação comprarmos o The New York Times e ver nossos nomes nele, privilégio apenas de quem corre em menos de 4 horas e meia. Acompanhando a tradição, usamos a medalha durante uns 3 dias e a toda hora ouvíamos: "Congratulations". Alguns até pediam para tirar uma foto conosco e de alguns ouvimos que “é um honra para nós, vocês saírem do Brasil para vir correr em Nova Iorque”. Deu-me enorme satisfação cumprir o que me propus; conquistei algo que ninguém nunca me tirará, que só dependeu de meus esforços e mérito e terei para o resto da vida, algo, que em momentos de dificuldades, me lembrará do quanto eu sou forte.

Agora é hora de pensar no próximo desafio.

E você? Vai ficar somente no "eu acho que consigo" ou vai dar início ao seu sonho "impossível". Não falo apenas de correr uma maratona, vale qualquer coisa que o desafie, que o amadureça, que lhe faça correr riscos, que você questione se está ao seu alcance, que lhe tire da zona de conforto, que atualize suas potencialidades. Mesmo que seja um sonho sem importância para os outros, incompreendido. Vá em frente, you can do it! A sensação é indescritível ao realizá-lo e lhe dará coragem suficiente para enfrentar muitas coisas em outros aspectos de sua vida.

Vanusa, corredora de rua e maratonista. vanusabarreira@hotmail.com


quinta-feira, 11 de novembro de 2010

O que nos faz correr melhor

Por Rodolfo Lucena

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/eq2610201005.htm
POSTAR-SE em frente a uma banca de jornais e revistas é como se debruçar numa janela de onde só se veem sonhos, especialmente se seu olhar estiver voltado às publicações sobre saúde, bem-estar, esportes em geral e corrida em particular.

É um tal de dieta revolucionária, barriga tanquinho, fique seco em cinco dias, coma churrasco, lambuze-se de pudim e pavê e emagreça dez quilos em uma semana sem fazer força que dá vontade de comprar todas aquelas revistas e experimentar as receitas para virar campeão de tudo e, ainda por cima, bonito...

Para um sujeito como eu, então, mais baixo do que gostaria e mais pesado do que deveria, é um mavioso canto de sereia. Mais sedutor ainda se acrescentar fórmulas para o primeiro 10 km em 40 minutos ou para a maratona em menos de três horas.

Acontece, porém, que já corro há mais de dez anos, já vivi mais de 50 anos e aprendi que nada disso dá certo. A gente só emagrece se comer menos e melhor, só fica forte se treinar mais e melhor... Ficar bonito é em outro departamento, mas tornar-se mais rápido é possível.

Não que eu seja um bom exemplo de velocidade, mas já fiz 10 km em 47 minutos e acredito que, se treinar, possa cortar mais uns quatro minutos disso aí. Mas, para mim como para qualquer um, há que treinar e manter o treinamento pela vida afora.

Se você quer ficar mais rápido, treine velocidade. Uma vez por semana, uma vez a cada 15 dias, que seja. O melhor é fazer isso sob orientação, mas posso contar alguns treinos de que gosto.

Sempre prefiro os que combinam resistência e velocidade. Na pista, gosto da chamada pirâmide: correr 400 m, depois 600, 800, mil e 1.200 m. Em seguida, repito tudo, mas invertido: 1.200, mil, 800 ..., sempre procurando manter o mesmo ritmo e dando um trotezinho de uma volta entre um esforço e outro.

Nos treinos para maratona, a coisa muda de figura. Gosto de tiros mais longos, de 3.000 m, procurando manter um ritmo um pouco mais forte do que o esperado para a maratona. Ao longo das semanas de treinamento, vou aumentando o número de tiros, indo até sete, intercalando com um quilômetro de trote.

São treinos simples, mas eficientes. Estão longe de uma janela para sonhos, como a banca de revistas. Ao contrário, são duros, concretos. Caminhos feitos de asfalto que, ao longo de semanas, meses, anos, nos ensinam novos rumos e nos abrem as portas da percepção.
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RODOLFO LUCENA , 53, é editor do caderno Tec e do blog +Corrida (maiscorrida.folha.com.br), ultramaratonista e autor de "Maratonando, Desafios e Descobertas nos Cinco Continentes" (Record)

domingo, 7 de novembro de 2010

Manual da 1ª maratona: dicas práticas para os corredores

Por Rodrigo Cury - redação ativo.com

http://ativo.uol.com.br/Esportes/Pages/ManualdaPrimeiraMaratona.aspx

Muitos dos corredores que se aventuram nos circuitos de rua têm como objetivo o desafio de um dia completar uma maratona. Provas de 10 km, 15 km como a tradicional São Silvestre, e os 21 km que compõem uma meia maratona são os principais degraus a serem superados antes de se chegar o a grande meta, a primeira maratona.

Algumas coisas podem ajudar, como dicas de atletas mais experientes e a escolha de um percurso relativamente plano e com baixa umidade, mas, o principal mesmo é seguir à risca as planilhas de treinamento.

O ativo.com “recolheu” dicas preciosas para ajudar no sucesso de sua primeira maratona:

- O primeiro passo é a escolha da prova. Datas e locais, assim como a altimetria e o clima, devem ser os primeiros fatores a serem considerados. Escolha a data com bastante antecedência e se planeje para fazer provas com distâncias menores como treinos. 

- A escolha de um local onde a família e os amigos poderão torcer por você tambem são pontos relevantes a serem considerados.

- Uma vez devidamente preparado para a prova e depois de já decidido onde e quando será o desafio, a hora é de garantir sua inscrição e cuidar da parte logística, como passagens aéreas/terrestres, hospedagem e transalados, inclusive para a largada da prova, isto se a escolha for longe da sua cidade.

- O passo seguinte é escolher o material e a suplementação que serão utilizados no dia. Tênis, roupas, se vai usar boné/viseira, óculos escuros e se preparar para levar os gels e outros suplementos que serão consumidos no dia.

- Nunca deixe para estrear aquele tênis novo, ou tomar aquele gel que ainda não conhece neste dia. O importante é que você já esteja habituado com todo o equipamento, assim evitará surpresas desagradáveis .

- No caso de escolher uma prova em outro país, planeje-se para viajar e chegar pelo menos quatro dias antes , assim terá tempo suficiente para se recuperar das longas horas de voo e dará o tempo certo para seu organismo se acostumar com outro fuso horário.

- Se estiver em uma cidade ou país diferente, não faça passeios nos quais precise andar muito antes da prova. O momento é de descançar, se hidratar bem e comer somente aquilo que já está acostumado e que lhe foi recomendado pelo treinador. Aproveite para rever o percurso da prova na Internet, assim como os postos de hidratação, e mentalizar como será a sua prova.

- Procure deixar tudo pronto na véspera, número de peito afixado, gels e outros suplementos que serão consumidos já separados, chip preso ao tênis (no caso de ser entregue junto com o kit) e tudo mais que será utilizado no dia.

- No dia da prova, procure acordar com pelo menos três horas de antecedência, assim terá tempo suficiente para ir ao banheiro com calma, tomar café e chegar para a largada uma hora antes. Esta hora servirá para você se aclimatar com o evento, alongar e aquecer-se bem e se posicionar o mais na frente possível.

- Tocada a buzina, não deixe a emoção tomar conta e lembre-se que você terá 42 km pela frente, portanto calma, nada de olhar para os corredores ao lado e querer acompanhá-los. 

- Procure seguir às riscas as instruções passadas por seu treinador ou nutricionista a respeito da suplementação na hora da prova e da hidratação nos postos disponíveis.

- E se em algum determinado momento da prova o cansaço falar mais alto, respire fundo e pense em tudo aquilo que fez para chegar aonde chegou e se inspire para cruzar a linha de chegada no seu ritmo.